O Dogma da Religião

A diferença entre crer próprio e crenças em que nos fazem acreditar cegamente

Daniel Covas
5 min readFeb 1, 2024

No último final de semana, através de um período de sensivelmente vinte e quatro horas de detox tecnológico no dia de sábado, estimulei o meu estado de presença e de conexão. Mais do que isso, aproveitei muito aquilo que foi um género de retiro a dois. Esta viagem terminou no domingo, com uma passagem no famoso Santuário de Fátima, ponto de relevância religioso do país. O que me trouxe à mente a escrita deste tema, esta semana. Não só por acreditar que já o abordei levianamente noutras publicações e sim porque acredito que é importante a repetição como parte do nosso treino. Porque o treino mental também inclui repetições, como qualquer bom treino. Os exercícios é que são diferentes e tão simples, que é bem mais fácil de serem ignorados e cair no esquecimento.

Este blog é um treino em si. Para mim, é um treino de escrita. De aprimoramento. De limar arestas, de ligações entre escrita e ideias, de colocar por palavras aquilo que corre na mente.
Para ti que lês, é um treino de desafio de crenças. De questionamento. De reflexão. Sobretudo, é um treino de pensamento.

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Religião

Dentro das diferentes correntes religiosas que existem espalhadas pelo mundo, como qualquer coisa, têm similaridades e diferenças. Por definição, religião é um culto prestado à divindade; uma doutrina; comunidade religiosa que segue a regra do seu fundador.

Várias religiões, como as conhecemos, divergem quer no seu tipo de adoração (monoteístas e politeístas), nas suas práticas, na forma e princípio como esperam que os seus seguidores cumpram com as regras. Algumas baseiam-se em princípios mais ditatoriais e outras em princípios mais liberais. Não querendo fazer disto puramente uma crítica, o que mais me incomoda no meio de tudo é a forma cega como são seguidos, de forma radical, os princípios religiosos. No fundo, simplesmente para prevalecer. Não quero acreditar que esse seja o espírito com que a religião foi criada, apesar de todas as evidências apontarem mais e mais nesse sentido.

Credo

Aquilo em que acreditamos ou escolhemos acreditar molda quem somos. São as crenças uma das partes que definem a identidade. Crenças essas que são uma amálgama entre as que nos impõem através de educação, pelos nossos familiares, através da cultura e ambiente em que estamos inseridos e por último, as que escolhemos. A panóplia de crenças que adotamos constitui o nosso credo.

O que tem o credo a ver com religião? Nada. Ou tudo.

Existem pessoas que nem se importam com a questão divina ou espiritual. Esses não entram nestas contas. Outros, podem adotar o credo religioso como o seu próprio e segui-lo à risca. Nestes, existem dois tipos: os que se entregam à doutrina propositadamente e outros que se regem por ela sem razão sustentável, apenas porque sim. É nesta diferença e sobre ela que realmente quero debruçar-me ao longo dos próximos parágrafos.

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Religião vs Espiritualidade

A religião não é sobre divindades, é sobre a humanidade. Diria até, sobre o controlo dela com uma série de dogmas pré-definidos e inquestionáveis. Quando tornamos algo inquestionável e factual, é bom que tenhamos a certeza que é algo que sirva o bem comum e não algo que nos torne cegos.
1 + 1 = 2 é uma operação aritmética que todos conhecemos e assumimos como verdadeira, pela sua factualidade e objetividade. Um princípio que não discrimina, não desvaloriza e não causa qualquer tipo de mal-estar. É um princípio universal.

Por outro lado, alguns dos dogmas religiosos que se nos apresentam, ainda que se mostrem factuais (muitas vezes com alguma dificuldade em serem comprovados de tal forma), tendem a ser um tanto quanto subjetivos e a estarem abertos a discussões entre cenários razoáveis e absolutos. Isto provoca uma certa dose de incerteza, que coloca as pessoas numa corda bamba de “estás dentro ou estás fora”. Esta radicalização da falta de meio-termo é algo que me incomoda e que acabou por me afastar da religião como ela é e me fez apreciar a parte puramente espiritual que ela transmite.

Por outro lado, a espiritualidade é a adoração objetiva própria da forma ou formas divinas em que escolhemos acreditar. Sei que objetividade própria acaba por se tornar em subjetividade, no entanto usei essas palavras porque, no que toca à espiritualidade, ainda que olhemos para uma mesma figura divina de maneira diferente, é a crença nela que é objetiva, sem que se procure uma imposição de dogmas ou verdades perante terceiros. Deste modo, escolhe-se a forma como se quer acreditar, no que acreditar e como usar isso a fazer, partindo claro de princípios éticos e justos, que visam o bem-estar pessoal e comum da sociedade. Procurar espiritualidade para agrado próprio e justificar ações que sabemos de antemão serem pobres, fracas, injustas ou desleais é puro egocentrismo e narcisismo.

Considerações finais

Como inscrevi no parágrafo introdutório, estive no Santuário de Fátima. Fui ao local, prestei a minha homenagem e participei no ritual de queimar as velas. Não porque seja religioso e siga os ensinamentos da Igreja, porque não o faço. Sim porque acredito no poder divino que habita o Universo e que, através destes rituais, conseguimos estabelecer uma intenção e ligação com esse mesmo poder. Esta é uma das partes do meu credo. Que eu desenvolvi. Não desejo que o sigas, espero sim que te desafies a questionar e duvidar daquilo em que acreditas. Sejam valores e princípios religiosos ou de outra natureza. Porque só quando ousamos duvidar das coisas que sabemos conseguimos abir espaço à aprendizagem de novas.

Quero deixar o lembrete final que, se segues alguma doutrina religiosa, qualquer que ela seja, o faças de forma consciente. Porque verdadeiramente os teus valores se alinham com aquilo em que crês.

Caso assim não seja, larga isso. Mais do que tudo, estarás a enganar-te e iludir-te a ti próprio. Caso não sigas a religião e ainda assim te consideres um crente na vertente espiritual e divina da vida, desenvolve o teu próprio credo. Explora as linhas de pensamento que as religiões têm para oferecer e não te apegues ao que pregam. Retira a tua própria mensagem e usa isso como base para a tua fé. Porque todos, sem exceção, seja ou não proveniente de uma fonte sobrehumana, temos algum tipo de fé, uma vez que a vida não é uma certeza absoluta. Digo-te isto porque, até aquele que diz não acreditar em nada, tem de acreditar nisso.

Já duvidaste das tuas verdades hoje?

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Daniel Covas
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Written by Daniel Covas

Mental Coach, Behaviour Analyst, Digital Strategist. Beat the Mind Founder. https://www.instagram.com/danny_covas/

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