Luxo
Uma reflexão sobre materialismo
Há umas semanas atrás, vi um vídeo com o título “O esquema da luxúria”, que me fez refletir um pouco e trazer o tema para aqui. Para que, de alguma forma, possamos fazer uma reflexão conjunta sobre este tópico. No dito vídeo, é descrito que os produtos de luxo estão desenhados para pessoas pobres. E que existem dois estatutos diferentes para abordar ou evitar este dito esquema: Ser pós-luxo ou pré-luxo. Com base nisto, vou expandir um pouco estes dois aspetos, pegando na definição que lhes foi atribuída no vídeo e depois sim, irei deixar a minha opinião pessoal e reflexão sobre o tema.
- Para quem são as marcas/produtos de luxo?
- Pós-luxo
- Pré-luxo
- Reflexão sobre temas associados
Antes de começar a abordar o que quer que seja, deixar aqui um aviso importante: riqueza e luxo são dois conceitos que, ainda que estejam associados, são completamente distintos. A minha opinião entre um e outro são completamente diferentes e o que vou referenciar sobre luxo não reflete de forma alguma a minha opinião sobre riqueza. Vou acabar por voltar a falar desta distinção no final. Apreciem!
O “alvo” do luxo
Segundo descrito, o público-alvo deste conceito são as pessoas que, claro, terão de ter o poder de compra mínimo para os adquirir e que vivam, de alguma forma, “viciados” no sentimento despertado por esse mesmo mercado. A ideia de que somos movidos para obter algo não vem de agora. Desde sempre que este estímulo existe. A libertação de dopamina torna-se viciante e recompensa-nos por satisfazer uma necessidade. Ela não está associada a obter algo, necessariamente. É libertada naquele momento em que tomamos a decisão de comprar, de fazer, de obter o que quer que seja. E logo a seguir, desvanece. O nosso sistema está desenhado assim, a nível químico. Por isso é tão importante ter a inteligência emocional suficiente para manipular as nossas reações automáticas a este tipo de estímulos, de forma a lidarmos com a vida de forma mais profunda e não tão superficial. Se o nosso cérebro se desenvolveu para chegarmos até aqui, devemos efetivamente usá-lo e não deixá-lo correr em piloto automático, tornando adormecidas as funções mais avançadas e modernas que ele tem.
Neuroplasticidade à parte, a realidade é que o desejo de adquirir este tipo de bens pode estar associado a várias coisas: assinalar a riqueza individual; demonstrar estatuto; desenvolver uma aparência excessiva…
Qualquer que seja a origem interna que nos faz adquirir algo dentro deste conceito, vai ser sempre algo que nos vai servir no mundo material. Nada que nos vá preencher numa dimensão da nossa vida para além de satisfazer essa necessidade, qualquer que ela seja. Com isto, fecho esta parte inicial para dizer que ao nível da aquisição, este bem não preenche nada em nós. Pelo contrário, pode, em vários casos, criar um vazio ainda maior.
Pós-luxo
Esta é uma fase que, tal como o nome descreve, indica um ultrapassar do luxo. Segundo o vídeo que vi, é o estado que remete para aquele substrato social que alcançou um nível de abundância financeira capaz de coisas anormais. Dando o mesmo exemplo do vídeo: “Quando ganhas o suficiente para comprar um Ferrari, é possível que o faças. Quando tens uma fortuna tão grande que te permite comprar a corporação que é a Ferrari, conduzir um ou não torna-se irrelevante.”
Ou seja, estamos a falar do tipo de indivíduos que já ultrapassaram qualquer tipo de necessidade de demonstrar, comprovar ou assinalar a sua riqueza. Estão num patamar tão elevado que, a nível aquisicional, sabem que podem ter praticamente tudo. O que lhes dá este poder de, de certa forma, menosprezar os produtos de luxo.
Pré-luxo
O curto clípe que vi foi retirado de um podcast. E o interlocutor sugeriu a existência deste tipo de posição em relação ao luxo: ser pré-luxo. Em que a conclusão de não necessitar dos bens de luxo é a mesma do anterior, de uma perspetiva diferente. É alguém que percebe que esses bens não vão trazer o que pensava que iam trazer. E então, o processo de decisão em aquisições não envole logótipos, estatuto ou o assinalar do que quer que seja.
Espaço de reflexão
Do consumismo ao materialismo e chegando ao minimalismo, é importante chegar a uma conclusão equilibrada perante estes “ismos”. Voltando a uma questão do início, riqueza e luxo são temas associados porque, mentalmente, fazem sentido de ser aproximados. Um significa que se possuí grandes recursos financeiros, o outro exige o gasto de grandes quantias financeiras. Hoje não venho com uma intenção tão crítica como o fiz na semana passada. A intenção de hoje é efetivamente o título do parágrafo: reflexão. Porque ser materialistas, consumistas, minimalistas ou outra coisa qualquer, independentemente de qual for o nosso grau de riqueza, se o levamos ao extremo, torna-se prejudicial. O que define estes hábitos é mais o nosso desejo de aquisição. Portanto, temos de explorar mais a fundo essa vertente psicológica.
As marcas de luxo estão desenhadas, maioritariamente, para exibição. Para que os seus clientes, que usam as suas peças, não precisem dizer “olha aqui, estou a usar a marca X” porque o produto já o diz por si. Não se compra o produto, compra-se, literalmente, a presença da marca na nossa vida. Não há certo nem errado aqui. Conheço muito boa gente, de quem gosto muito, que usa produtos de marcas de luxo porque tem essa capacidade. Se o compram por terem a possibilidade e o usam por gostarem, a partir de uma posição de autenticidade, espetacular.
O problema prende-se quando a aquisição e o uso estão associados a uma questão de ego. De exibição. De sinalizar uma posição. Por norma, quando se parte deste segundo estado, é um esforço para criar uma “cortina de fumo” e uma imagem que não representa a realidade. Aqui sim, é preocupante. Para a pessoa em específico, porque está a entrar numa espiral que só a vai prejudicar no longo prazo, a vários níveis. Está muito presa na superficialidade da vida. E depois à questão da inveja. Da dinamização de imagem por afetar outros. E claro, é problema e responsabilidade de cada indivíduo lidar consigo próprio e com aquilo que sente, seja em relação ao que for. No entanto, a realidade é que isto parece tornar-se uma espécie de vírus social, por várias razões psicológicas, relacionadas com criação de expetativas irrealistas, perspetiva imóvel e inadaptável, entre outras coisas.
Claro, deixo-vos o meu exemplo. Sou um fanático de tecnologia e gadgets. Computadores e telemóveis, ia muito atrás das marcas (Microsoft e Samsung, respetivamente). No caso de roupa, por exemplo, não me importava nada com isso. Uns ténis quaisquer. Uma blusa. Calças ou calções. Está feito. Quero lá saber de onde vêm. Acredito que, e são aspetos nos quais tenho refletido nos últimos tempos, estou em extremos opostos nesses campos e devo chegar a um outro ponto de equilíbrio, em cada um deles. Hoje olho para as coisas de forma diferente por isso. Provavelmente, a próxima vez que for substituir o meu computador ou telemóvel, vou estar mais atento às especificações técnicas e procurar a melhor relação preço/qualidade, descurando mais a marca. Ao mesmo tempo, no caso da indumentária, começo a dar mais atenção agora à importância de comprar peças com um mínimo de qualidade, não só para ter mais conforto como para que tenham mais durabilidade. Mais do que isso, a nossa imagem a nível profissional acaba por refletir alguma coisa sobre nós. Não importa vestir de marca, importa sim vestir de forma a realçar que nos preocupamos em tratar de nós próprios. Mais uma vez, é simplesmente a minha perspetiva e é o equilíbrio que estou a encontrar para mim, entre o extremo de “acreditar puramente e apenas nas marcas” e o “total desinteresse na qualidade, simplesmente para suprimir a necessidade”.
“A maneira como fazemos uma coisa, é a maneira como fazemos tudo.”
Acredito que, tanto o consumismo como o materialismo, que estão intrinsecamente ligados, se tornaram em algo que reflete, mais do que tudo a superficialidade e velocidade com que vivemos hoje em dia. Queremos o melhor que o dinheiro pode comprar, agora mesmo, para nos podermos transportar de produto em produto, de forma a ignorar o que é realmente importante na vida. Usamos este nível de banalidade porque facilita o suprimir da dor, através de uma das maiores mentiras da vida: “quando tiver aquilo que quero, vou ser feliz.” E perseguimos de forma desenfreada o alcançar de objetivos só para descobrir que, o alcançar não é nada, nem preenche nada. É o que nos tornamos no caminho que importa. São os esforços em trabalharmos em nós próprios, em colmatar as nossas áreas vitais que precisam de progredir. Essa é a única forma de preencher interiormente o que quer que seja.
Do outro lado temos o minimalismo. Uma corrente que, na teoria, veio para combater o consumismo e o materialisto. A ideia essencial é viver com os mínimos (que surpresa, é daí que vem o nome) de forma a nos desapegarmos da ideia de comprar e ter tudo. Eu gosto desta corrente, tem um conceito interessante, com aquilo que para mim é o foco errado de base: o ter.
Se queremos combater o consumismo e o materialismo nas nossas vidas, não vamos usar o comportamento contrário. Estamos a evitar, não a resolver nada. Voltamos à superficialidade. Tratamos do sintoma, não do problema original.
Deixar o consumismo e o materialismo passa por ressignificar emocionalmente a necessidade de ter que associamos ao que desejamos. Passa por virar o foco para a profundidade interior em vez de continuar a viver preso à superficialidade exterior. Mudar este modelo mental poupa, literalmente. E não é só de dinheiro que estou a falar. Poupa sobretudo, a saúde mental e emocional. E dá até, a capaciade de irmos mais e mais longe numa vida que eventualmente se tornará mais preenchida.
Termino como comecei. Apraz-me ver riqueza. Pessoas abundantes. São indivíduos extremamente interessantes, com uma profundidade de conversa incível. O luxo, por outro lado, é algo que abomino. Pela vertente exposicional. Um introvertido como eu gosta de seguir o seu caminho em paz. Notado por quem vale a pena e reconhece o meu intrínseco valor, apenas. Não desejo atrair atenções desnecessárias. É a minha perspetiva, não está certa nem errada (sempre importante frisar. É um prazer ter pessoas que me leêm e seguem e não quero que pensem como eu. Quero que reflitam e cheguem às próprias conclusões. Aí, se concordam e acreditam no mesmo, tudo bem.)
No final do dia, independentemente do tema, o meu objetivo aqui é criar pessoas que pensam. Com um espírito crítico. Que sabem refletir. Que são livres, mentalmente, para serem quem são.
Já pensaste hoje sobre as tuas necessidades e porque as suprimes da forma que fazes?